Este domingo, centenas de apoiantes do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro invadiram e vandalizaram o Congresso Nacional, o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal Federal (STF), sedes do poder legislativo, executivo e judiciário do Brasil.
Os manifestantes – muitos dos quais estavam acampados há semanas em frente ao Quartel-General do Exército em Brasília – começaram por se concentrar em frente ao Ministério da Justiça.
Avançando pela Praça dos Três Poderes este domingo, os manifestantes invadiram o Congresso, conseguiram entrar no Palácio do Planalto e o alvo final foi Supremo Tribunal Federal, deixando pelo caminho um rasto de destruição, vidros partidos, móveis atirados para o exterior, computadores e outros monitores atirados ao chão, um brasão da República foi retirado das paredes do STF, o quadro “As Mulatas”, do pintor Di Cavalcanti, foi rasgado e a escultura “A Justiça”, feita em 1961 pelo artista plástico Alfredo Ceschiatti, foi pintada, foram roubados documentos, além de armas e munições que estavam nos gabinetes de segurança destas instituições.
A polícia terá tentado travar os manifestantes com gás pimenta, mas estes furaram sem grande dificuldade, este domingo, a barreira policial montada em frente a estas instituições.
Também o secretário de Segurança Pública do Brasil, Fernando de Sousa Oliveira, tinha enviado mensagens ao governador Ibaneis Rocha, salientando que estava “tudo tranquilo” e que a manifestação era “totalmente pacífica”.
De acordo com o secretário, teria havido uma negociação com os manifestantes que estavam acampados em frente ao quartel-general do Exército, adianta a Folha.
Começaram a circular vídeos onde se veem polícias militares do Distrito Federal impávidos perante a invasão, a tirar fotografias com o telemóvel. Contudo, há registo de confrontos com os manifestantes, que atiraram grandes de ferro e outros objetos contra a polícia, danificaram viaturas das autoridades, tendo inclusivamente atirado um carro para dentro do espelho d’agua que está localizado em frente ao Congresso.
Membros do governo de Lula, da Polícia Federal e do STF apontam baterias ao governo do Distrito Federal, em especial à Secretaria de Segurança local, liderada pelo ex-ministro da Justiça Anderson Torres, responsabilizando-os pela invasão.
Este acampamento existe desde a vitória de Lula da Silva na segunda volta das eleições presidenciais brasileiras. Anderson Torres, nomeado recentemente secretário de Segurança do Distrito Federal é apoiante público de Jair Bolsonaro e atuou como Ministro da Justiça até quase ao fim do mandato do ex-presidente.
Ainda que tenha assumido funções muito recentemente e mesmo perante os receios de uma reação bolsonarista à eleição do Lula da Silva, Torres tirou férias e está nos Estados Unidos, na mesma cidade em que se encontra Jair Bolsonaro.
Torres, questionado pela Folha, disse que “não houve leniência. É a primeira vez que tiro férias em muito tempo. O planejamento foi feito”, garantiu. “Não vim para os EUA para encontrar Bolsonaro. Não me encontrei com ele em nenhum momento. Estou de férias com a minha família. Não houve nenhuma trama para que isso [os atos golpistas] ocorresse”, acrescentou.
Na sequência desta invasão, Anderson Torres foi demitido pelo governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha, que fez um vídeo a pedir desculpa ao atual presidente pelas invasões. Isso não impediu, todavia, que fosse suspenso por 90 dias.
No total, pelo menos 300 simpatizantes do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro foram presos por invadir e destruir as sedes do Congresso, da Presidência e do Supremo Tribunal Federal, numa alegada tentativa de derrubar o Governo. Foram ainda apreendidos 40 autocarros e identificados “os seus financiadores”. Note-se que centenas de autocarros vieram de todas as partes do país, este fim de semana, para Brasília, e em muitos deles as pessoas não tiveram de pagar a viagem, detalharam as autoridades.
Também o atual ministro da Defesa, José Múcio, escolhido já por Lula da Silva, está debaixo de fogo. Este defendeu uma desmobilização gradual do acampamento bolsonarista durante o período de transição de poder, tendo dado garantias ao ministro da Justiça, Flávio Dino, de que a questão estaria resolvida até 6 de janeiro — o que claramente não aconteceu.
Um ministro e um deputado brasileiros denunciaram que apoiantes do ex-Presidente Jair Bolsonaro roubaram armas de fogo, guardadas no palácio presidencial em Brasília, aquando da invasão, no domingo, das sedes dos três poderes do país.
O ministro da Secretaria de Comunicação Social da Presidência brasileira, Paulo Pimenta, mostrou dois estojos de armas de fogo vazios, em cima de um sofá parcialmente queimado no Palácio do Planalto, de acordo com um vídeo e fotografias divulgadas na rede social Twitter.
O deputado Wadih Damous, que acompanhou Paulo Pimenta, sublinhou que os assaltantes “tinham informações” sobre o que estava guardado no Gabinete de Segurança Institucional da presidência, uma vez que levaram armas, munições e documentos.
Apesar dos danos causados, o Presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, garantiu que vai retomar hoje os trabalhos no Palácio do Planalto, numa mensagem divulgada no domingo no Twitter. “Os golpistas que promoveram a destruição do património público em Brasília estão sendo identificados e serão punidos (…). Democracia sempre”, salientou.
Lula da Silva deslocou-se no domingo à noite à sede do executivo brasileiro para conferir os estragos provocados no local e foi ainda recebido pela presidente do Supremo Tribunal Federal, Rosa Weber, na sede do Supremo Tribunal Federal.
Escreve a Folha de São Paulo que, após a invasão ao o Congresso Nacional, ao Palácio do Planalto e ao Supremo Tribunal Federal (STF), os apoiantes inconformados de Bolsonaro regressaram ao Quartel-General do Exército em Brasília, onde estão acampados desde que Lula da Silva ganhou as eleições.
A Polícia do Exército já pediu aos bolsonaristas desmobilizem, mas estes recusam-se a seguir e orientação e permanecem no local. Não estão a ser também, note-se, forçados a deixar a zona.
Segundo relatos feitos à Folha, a cúpula do Exército e do Ministério da Defesa querem evitar um confronto direto com os manifestantes, pelo que têm optado por “estrangular” a logística daqueles que insistem em pernoitar no local. A estratégia, todavia, tem sido alvo de críticas pela sua ineficiência.
O que diz Bolsonaro sobre a invasão
Antes do ex-presidente, o líder do Partido Liberal (PL), força política de Jair Bolsonaro, fez questão de se demarcar da “vergonha” desta invasão, classificando este 8 de janeiro com um dia “triste” para o Brasil.
Sérgio Moro, antigo ministro da Justiça do governo liderado por Jair Bolsonaro e agora Senador, utilizou as redes sociais para apelar à retirada dos manifestantes dos edifícios públicos que foram invadidos, defendendo que “a oposição precisa ser feita de maneira democrática, respeitando a lei e as instituições”.
Anderson Torres foi um dos primeiros aliados de Jair Bolsonaro reagir, dizendo, ainda antes da sua demissão, que é “inconcebível a desordem e inaceitável o desrespeito às instituições. Determinei que todo o efetivo da PM e da Polícia Civil atue, firmemente, para que se restabeleça a ordem com a máxima urgência. Vandalismo e depredação serão combatidos com os rigores da lei”, afirmou.
Tardiamente, já a polícia tinha retomado o controlo da Praça dos Três Poderes, Bolsonaro reagiu no Twitter dizendo que “repudia as acusações, sem provas, a mim atribuídas por parte do atual chefe do executivo do Brasil. Ao longo do meu mandato, sempre estive dentro das quatro linhas da Constituição respeitando e defendendo as leis, a democracia, a transparência e a nossa sagrada liberdade. Manifestações pacíficas, na forma da lei, fazem parte da democracia. Contudo, depredações e invasões de prédios públicos como ocorridos no dia de hoje, assim como os praticados pela esquerda em 2013 e 2017, fogem à regra”, escreveu.
Reação de Lula da Silva à invasão
O agora presidente do Brasil considerou este incidente uma “barbárie”, levada a cabo por “fascistas fanáticos”. Para Lula da Silva, não há dúvidas sobre o grande responsável por esta invasão: Jair Bolsonaro.
Referiu-se ao ex-presidente brasileiro como um “genocida” que “não só provocou isso, não só estimulou isso, como, quem sabe, está estimulando ainda pelas redes sociais também”.
Ainda assim Lula foi o primeiro a apontar a existência óbvia de “falhas na segurança” e prometeu que todas as pessoas envolvidas serão “encontradas e punidas”.
O presidente brasileiro decretou entretanto a intervenção federal na área de Segurança Pública de Brasília. A par, relata a Folha, o Exército colocou tropas em Brasília em estado de prontidão para o caso de ser acionado um decreto Garantia da Lei e da Ordem. Segundo o jornal, cerca de 2.500 militares estão aquartelados em Brasília.
Ainda no domingo, Lula da Silva visitou o Palácio do Planalto e o Supremo Tribunal, sem prestar declarações à imprensa. Apesar dos danos causados, o presidente garantiu que vai retomar hoje os trabalhos no Palácio do Planalto, numa mensagem divulgada no Twitter.