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Dom 22 Dezembro 2024
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IGC desvenda pontos estruturais do vírus SARS-CoV-2 que enganam o sistema imunitário

Investigadores portugueses descobriram dois pontos estruturais de uma das proteínas do vírus causador da COVID-19 propensos a evoluir variantes que escapam à resposta imunitária, passando mais despercebidas aos anticorpos gerados após a vacinação ou infeção. O estudo publicado na Revista PLOS Pathogens, focou-se na estrutura da proteína Spike, essencial para a entrada do vírus nas células e o alvo primário das vacinas atualmente administradas. Conhecer e conseguir prever como estas mudanças afetam o decorrer da infeção é uma arma importante para o ajuste das estratégias de controlo da pandemia de COVID-19.

Até meados de abril de 2021, contabilizavam-se mais de 140 milhões de casos de COVID-19 em todo o mundo. Uma elevada transmissão aumenta inevitavelmente a probabilidade de evolução de novas variantes. Entre elas, as que conferem ao vírus SARS-CoV-2 capacidade de evitar o sistema imunitário, escapando ao hospedeiro sem comprometer a sua replicação. “Sabemos que o vírus está a mudar e é importante conseguirmos perceber e prever que mutações afetam o decorrer da infeção. Neste estudo, conseguimos demonstrar que existem dois pontos da proteína Spike que são propícios a mudar para escapar ao sistema imunitário. Este tipo de conhecimento é crucial para nos conseguirmos antecipar ao vírus e ajustar as nossas estratégias de combate à pandemia”, descreve Maria João Amorim, investigadora principal do Instituto Gulbenkian de Ciência (IGC) que liderou o estudo.

O estudo desenvolvido no IGC em colaboração com as equipas lideradas por Cláudio M. Soares, do ITQB NOVA, e Helena Soares, do Centro de Estudos de Doenças Crónicas (CEDOC) da NOVA Medical School, focou-se na estrutura da proteína Spike do SARS-CoV-2. Para determinar o efeito de mudanças nesta proteína, a equipa de investigadores recorreu a técnicas que permitem expressá-la em partículas virais não nocivas, fáceis de estudar e que não requerem laboratórios de alta segurança. Adicionando anticorpos produzidos após infeção ou vacinação a células e partículas virais em cultura, é possível medir a proteção que estes exercem contra cada variante. “Através desta técnica, detetámos duas mutações em pontos diferentes da Spike que fazem com que o vírus se escape aos anticorpos gerados após infeção ou administração da vacina. E isto ocorre sem comprometer a sua entrada nas células, porque não afeta a ligação ao recetor celular necessário para esse processo. Com estas alterações, o vírus continua a entrar nas células sem grande custo para a infeção e evita o reconhecimento por parte dos anticorpos”, explica Maria João Amorim.

Diana Lousa, do ITQB NOVA, recorda como partiram de uma ideia simples. “E se olhássemos conjuntamente para os dados da ligação aos anticorpos e ao nosso recetor?” Através da simulação molecular e da análise de dezenas de estruturas, foi possível prever quais as mutações que poderiam dar vantagem ao vírus, permitindo-lhe escapar aos anticorpos, sem perder a capacidade de nos infetar de forma eficiente. “Quando olhámos para estes dados, houve dois pontos que sobressaíram por terem potencial para albergar mutações que podem ser perigosas”, acrescenta a investigadora. De seguida, essas mutações foram testadas de forma experimental, na bancada do laboratório, onde se comprovou o potencial para escapar aos anticorpos. “Isto não teria sido possível sem uma estreita colaboração entre o trabalho experimental e computacional, que é essencial para andarmos à frente do vírus”, salienta Cláudio Soares.

Uma das mutações apontadas, denominada 484, já era conhecida e está incluída nas variantes preocupantes provenientes do Brasil, da África do Sul e da Índia. A outra mutação, a 494, surge como um novo ponto estrutural passível de se alterar no vírus SARS-CoV-2. “A mutação 494 faz parte da lista de variantes atualmente sob investigação dos CDC [Centers for Disease Control and Prevention] e da Public Health England. Com este estudo conseguimos provar que permite ao vírus escapar aos anticorpos. Isto comprova que devemos averiguar a necessidade de se desenvolverem vacinas e terapias que consigam responder a estas mutações, assim como determinar os mecanismos que permitem ao vírus replicar-se sem ser reconhecido”, adiciona Maria João Amorim.

“A imunidade após infeção ou vacinação é muito complexa, e uma das suas componentes mais importantes é a capacidade de produzir anticorpos que consigam prevenir a reinfeção. É crucial esclarecermos se estas variantes tornam as pessoas suscetíveis à reinfeção, mesmo que protegidas de desenvolver COVID-19 de uma forma severa. Estes fatores ainda desconhecidos devem fazer parte da nossa agenda já que são críticos para a tomada de decisões a nível governamental sobre manter ou aliviar as medidas de proteção e planear políticas de vacinação futuras”, diz Maria João Amorim.

O estudo foi desenvolvido no Instituto Gulbenkian de Ciência em colaboração com o Instituto de Tecnologia Química e Biológica António Xavier da Universidade NOVA de Lisboa e o CEDOC. O financiamento foi atribuído através da bolsa PTDC/CCI-BIO/28200/2017 e FCT RESEARCH4COVID 19 (Ref 580), da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT, Portugal) e também da Fundação Calouste Gulbenkian.

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